No mais recente episódio de “O Mais Famoso Podcast sobre Calçado“, Rui Oliveira abordou a atual crise que assola a indústria do calçado, identificando diversos fatores que contribuíram para o cenário desafiador que setor enfrente.
Segundo Rui Oliveira, os números das exportações de calçado para este ano não vão ser animadores, refletindo uma nítida queda nas encomendas e uma redução significativa na produção de pares de sapatos. “A indústria, em geral, não estava preparada para uma queda tão grande das encomendas“, afirmou Rui Oliveira, enfatizando que o cenário de 2023 tem sido particularmente sensível e extremamente difícil de gerir.
“Acho que a indústria de calçado estaria confiante, face àquilo que foi o ano 2022, de ter um ano de 2023 que não representasse novamente o mesmo volume total, o mesmo número de pares ou o mesmo nível de faturação, mas nunca reduzir a números como aqueles a que estamos a assistir“, declarou Rui Oliveira, expressando preocupação com a gravidade da situação.
Diante dessa crise que atinge em cheio o setor do calçado, Rui Oliveira não hesitou em afirmar que a palavra “crise” é, de fato, bem aplicada para descrever o cenário atual.
Para Rui Oliveira, a crise tem raízes num período excecional de encomendas ocorrido em 2022. Ele afirma que houve um volume anormal de pedidos, ultrapassando a capacidade de produção real das empresas e fábricas portuguesas, em especial de Felgueiras. Essa sobrecarga trouxe desafios tanto no planeamento e entrega das encomendas, quanto no aspeto financeiro, relacionado com a compra e faturação dos produtos.
“As entregas da estação de Outono Inverno 2022 ocorreram de forma muito tardia“, disse Rui Oliveira. A indústria de calçado portuguesa tentou ficar com o máximo número de encomendas possível, de forma também a vincular estes clientes para o futuro. “O que eu acho é que todas as empresas pensaram o mesmo”, explica Rui Oliveira.
A partir de maio e junho do ano passado, todos perceberam que o volume de encomendas era de tal ordem em todas as fábricas de calçado que “ia ser muito difícil cumprir com as datas de entrega” que tinham sido dadas aos clientes. “Estas entregas começaram a derrapar ao longo da estação e algumas foram entregues em setembro e outubro e novembro, quando as coleções de inverno já deviam estar nas lojas”, sublinha Rui Oliveira. Houve muitas coleções que chegaram às lojas tardiamente, até quase já num período de saldos, “o que não fez qualquer sentido para os clientes, porque naturalmente não tiveram o mesmo tempo de venda de coleções em loja que aquele que teriam caso as coleções tivessem sido entregues atempadamente”, destaca Rui Oliveira.
E isso leva a outro problema: “se as encomendas não são entregues no prazo que é estipulado, é natural que o tempo de venda seja mais curto, o que implica que haja excesso de stock”. Esse excesso de stock foi dos “fatores essenciais e predominantes para que a redução das encomendas nesta estação de Outono Inverno 23. É natural que os clientes fizessem reajustes, considerando aquilo que eram os seus stocks”, enfatiza Rui Oliveira.
Além disso, a deslocalização de algumas encomendas para o mercado asiático, devido às condições atrativas de preço, também contribuiu para a redução das encomendas de calçado português nesta estação de Outono Inverno 2023.
Também a guerra na Ucrânia e a inflação global têm impactado significativamente a economia e repercutem no consumidor final, que reduziu suas compras, afetando ainda mais a indústria do calçado.
Ou seja, temos uma inflação que está a levar os consumidores a comprar menos sapatos, a questão do excesso de stocks, bem como a deslocalização de uma parte da produção para a Ásia. “Há aqui três fatores que são uma tempestade quase perfeita para que os valores das exportações portuguesas de calçado reduzissem substancialmente este ano“, conclui Rui Oliveira.