Há histórias que só a política consegue escrever. Em Friande, concelho de Felgueiras, a corrida às eleições autárquicas de 12 de outubro trouxe um enredo improvável: pai e filho, lado a lado na vida, estarão frente a frente nas urnas.
Hugo Reis é candidato a presidente da Junta de Freguesia de Friande pela coligação Agora Felgueiras (PSD/CDS). Do outro lado da barricada está o pai, Manuel Reis, em 7.º lugar na lista da coligação Sim Acredita (Livre/PS).
Em casa, a surpresa inicial deu lugar a um entendimento raro, onde a família está acima da política.
“Eu disse-lhe: tu é que sabes, filho”
Manuel recorda o momento em que soube da decisão do filho.
“Ele contou-me por telefone, até. Estava em Miami, em viagem, e ligou-me a dizer que tinha sido convidado pelo PSD para ser candidato a presidente da Junta de Freguesia de Friande. Eu disse-lhe: ‘oh filho, tu é que sabes’. Mas também lhe disse logo que, se avançasse, não fazia sentido eu continuar na outra lista”, confessa.
A reação natural seria recuar, mas foi o contrário que aconteceu. O filho não só decidiu avançar, como incentivou o pai a não abandonar o seu lado político.
“Houve um dia em que disse ao Júlio [Pereira], que lidera a lista do Sim Acredita, que provavelmente não iria fazer parte da equipa. Mas depois o Hugo insistiu: ‘oh pai, não, continua na lista, isso não tem nada a ver uma coisa com a outra’.”

“Pai e filho, acima de tudo”
Para Hugo, esta é uma lição de convivência democrática.
“Cada um tem a sua opinião, as suas ideologias. Eu defendo uma coisa, o meu pai defende outra. Mas não vamos deixar de ser pai e filho, nem de ter uma boa relação dentro de casa. Fora de casa, cada um defende a sua lista. É assim que tem de ser.”
O jovem candidato mostra maturidade ao separar política e família, mas também emoção: “A relação familiar não é beliscada. Isso está acima de qualquer disputa.”
No futebol, não há divisões
Apesar de divergirem na política, pai e filho encontram sempre entendimento no desporto. Ambos são adeptos fervorosos do Futebol Clube do Porto, uma paixão que une e que serve de contraponto às diferenças eleitorais. “Aqui não há discussão possível”, garantem.
O dia das eleições
E como será o ambiente em casa no dia 12 de outubro? A resposta chega com humor.
“Há uma pessoa que vai beber champanhe, de certeza: a minha mãe”, diz Hugo, entre risos.
Manuel completa: “No fim, quem vai decidir é o povo. Eu, como faço parte de uma lista, quero que a minha lista ganhe. Mas se o Hugo vencer, logicamente, fico contente como pai. Politicamente fico triste, mas pessoalmente feliz.”
Entre o afeto e a política
O que em muitas casas poderia gerar divisão, em Friande é visto com naturalidade e respeito. Os Reis mostram que é possível divergir sem romper laços, e que a democracia começa dentro de casa.
No dia 12, Hugo e Manuel não serão apenas “nomes” em boletins de voto. Serão também o exemplo vivo de que a política pode atravessar famílias, mas nunca deve quebrá-las.
Em Friande, a decisão está nas mãos dos eleitores. Mas na casa dos Reis, a vitória já está garantida: a vitória do afeto sobre qualquer rivalidade.